
Palmas, a santinha que todo mundo passou a mão.
Tratada como muamba naquela Praça dos Girassóis, onde qualquer espertalhão abre sua pochete e compra só com o que tem dentro.
A terra onde o aproveitador e o pistoleiro se casaram (o casal perfeito).
Loteamento espoliado que um assessor do governo ganhou em troca de favor, depois dado a um agiota por uma dívida desonrada, o qual passou ao atravessador que repassou ao despachante de projetos de leis unilaterais, que vendeu ao caloteiro das pormenores coisas, que pagou à interposta pessoa em juramento de uma vantagem futura, que sempre quer saber se é hoje que a boquinha vai sair. “— é hoje que a boquinha vai sair?”
Terra de chumbados do espírito, aguerridos às bolas do cofre popular, que rotineiramente acertam a loteria mesmo sem jogar. Calor demais.
Terra em que os secretários, os administradores, os corretores, os advogados, os superintendentes, os assessores especiais, os contadores, os facilitadores (facilitadores!), nadam-se entre si, apoiando-se uns contra os outros pra chegar primeiro à licitação enxertada no gabinete do vereador, pela qual lápises, clipses e atlases defasados serão entregues a um colégio pubo em troca de milhares de reais.
Cidade de calçadas vazadas à braquiária, de praças aborrecidas e desleixadas, onde a Organização Pelo Futuro (OPF) caça crianças e as leva para a sede do Fisco (são uns promissores riozinhos de dinheiro público que é preciso represar, não?). Dos favores sacados dentro da carteira virada em cédulas cheias de durex.
Do suntuoso Palácio do Governador onde o aleijado financeiro não chega, murado por pilhas de ilicitudes que o auditor não viu, o escrivão deixou passar, o técnico não teve ciência, o juiz abdicou, o delegado desculpou, o fiscal embolsou, o promotor inimputou, o perito não terminou, o procurador não quis mexer, que o policial ajudou.
Hospedaria onde prefeitos refestelam-se cada qual sobre seu próprio colchão de impostos, recostados tranquilos ao travesseiro como só quem escolhe as pessoas certas para vender graças consegue fazer.
Lugar dum povo escorado ao bar de beira d’água, cujo ânimo foi trancado no guarda-volumes do boteco e a chave caiu dentro afora pela fossa da alma.
Cidadão de Porcarianópolis Nenhuma do Tocantins; pessoa cujo patronímico está positivado no Código Penal; eleitor cabresteado ao carnê do lote financiado; habitante desde o futuro-nenhum de nome Taquaruçu ao não-tem-futuro chamado Taquaralto. Calor demais.
Um lugar cujos dividendos turísticos são embolsados por deputadinhos e dados à própria família como se fossem balinhas jogadas pra cima.
Terra que é desminhocadamente ácida ou artificialmente adoçada, onde as folhas são vermelhas, os frutos explodem e só dá leite de cacto.
Cidade que produz senão promessas de resultados, miragens de realizações, decréscimos de rendimentos, pensamentos de ação, rascunhos de intenções. Fértil em obras inacabadas e igrejas desesperançadas.
Onde o funcionário público serve a si mesmo e o empresário é encarregado do político que naquela cadeira escrita “patrão” está ali sentado.
Cidade que só venta e quando não só venta só queima e quando não só queima só chove. Clima que ninguém suporta, mas a saída é longe e a vida de quem chegou não tem mais volta.
Prédios que estão mais para espinhas amaduradas, lotes enlixados, passeios recendendo a pequi congelado, que entre a ânsia de uma rotatória à ânsia d’outra só há gastura, enfaro e debilidade. Ruas sem acolhimento, nomenclaturas mudas, quadras constrangidas, avenidas tonturantes, trânsito de gangrenas com acidentes a cada… nem esquina é esse diacho!, faixas de pedestres atropelados |l|a|d|o|a|l|a|d|o|. Calor insuportável.
Onde os músicos costuram pra fora, os escritores o que sabem é chupar geladinha e os atores é representar que se adoram. Uma cultura de porta em porta nas secretarias estaduais vendida e que mais parece uma confissão de dívida.
E o comércio, esses profissionais em vender vasilhas de mangas amoscadas, cujo todo mundo sempre está trabalhando contrariado, e tanto o dono quanto o funcionário têm cara de quem toca MPT ao violão com o dedinho da mão direita levantado.
Palmas, na manhã do teu nascer e já esse calor do diabo!


